Fico sempre muito incomodado quando oiço que Milão, Nova York ou outra cidade que tal é a capital da moda.
Estas gentes não sabem do que falam. Em primeiro lugar, olham para a moda como se esse fenómeno se pudesse reduzir aos trapinhos que meia dúzia de tipos nos convencem a vestir ou àqueles desfiles de mocinhas alimentadas a folhas de alface com tofu e rapazes que deviam ter vergonha de andar naqueles preparos e que fazem as mulheres olharem para os seus maridos com um ar entre o enojado e o homicida. Depois, esquecem-se do mais importante, ninguém leva a moda tão a sério como os portugueses. Todas as modas. A moda em Portugal é como a crise: embrenhamo-nos de tal maneira na coisa que já não somos capazes de viver sem ela. E não é de agora.
Aqui há uns anos, na moda dos anoraks, vulgo Kispos, que deixavam um cidadão magrinho transformado num verdadeiro badocha, as ruas pareciam um anúncio permanente a uma famosa empresa de pneus. E quando estavam na moda as calças de ganga justas? A malta levava aquilo tão a sério que se aquela moda durasse mais tempo a raça lusa corria sérios riscos de extinção. Aliás, tenho para mim que a razão da rapaziada que anda agora pelos quarenta anos ter procriado tão pouco tem a ver com a temporada a que sujeitou determinadas partes do corpo a tão violento apertão.
E nós não nos limitamos a vestir ou a calçar o que a moda dita. Somos mais sofisticados que isso. Um português sai de casa com o seu pullover vestido. O dia põe-se mais quente e tira-se o dito adereço têxtil: onde colocá-lo? Ah pois, esta importante questão não é assim deixada ao Deus dará. Quando eu era adolescente punha-se à cintura, quando ia ali pelos vinte passou-se a usar pendurado ao pescoço e agora é colocado por cima de um dos ombros num equilíbrio instável.
Mas, claro está, isto da roupa é coisa pouca para mostrar a nossa verdadeira paixão pela moda. E as minhocas? É que nós já tivemos a moda dum adubo milagroso à base de minhocas vitaminadas. Dum dia para o outro não havia lusitano com meia dúzia de cobres no banco que não estivesse disposto a investir neste negócio. E os Kiwis? Houve uma altura em que se arrancou tudo o que era árvore para fazer plantações dessa fruta que só de olhar para ela se fica com cólicas. E lojas dos trezentos? Havia rua que não tinha outra loja que não fosse uma dessas. E acções? Era ouvir os comentários dos taxistas sobre cash-flows descontados, retornos do investimento e afins. Férias? Mas, há português de classe média que não tenha estado no Nordeste brasileiro?
Esta febre da moda em Portugal é tão intensa que até o Estado sente obrigação de não desconsiderar o vulgar cidadão e segue-lhe os passos. Só isso pode explicar a febre de construir auto-estradas. Havia necessidade de fazer meia dúzia delas, mas o Estado tomou-lhe o gosto e quando se deu por ela não havia logradouro que não fosse servido por uma auto-pista de três faixas.
Agora que precisamos tanto de exportar, devíamos montar umas escolas para explicar a esses estrangeiros que têm a mania que percebem disto como é que se faz. Uns amadores esses tipos.
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