Sexta-feira, 8 de Abril de 2011

Vou emigrar para Portugal

Ouço cada vez mais gente a querer emigrar. Percebo a urgência. Concordo com as pessoas. Acho que se tornou urgente emigrar. Eu próprio quero emigrar para uma nação da qual tenho recebido as melhores referências. Diz que, além da cultura, da História, do tempo, das comidas e de outras matérias igualmente importantes, tem gente de qualidade, com vontade de arregaçar as mangas onde elas devem começar por ser arregaçadas: nos bairros, nos pequenos redutos onde se fortalece a têmpera de um povo. Que é como quem diz nos quotidianos de cada um, sejam estes marceneiros, gestores de empresas ou economistas versados em tragedês.

 

Fartei-me de viver num condomínio novo-rico, dominado por um espírito arrivista, onde o bom é fazer "em grande" por fazer "em grande". Cansei-me de habitar num sítio onde o desgraçadismo  faz escola em grande escala - do café ao jornal de grande circulação - e onde os demónios são sempre os outros. Quero, sim, quero deixar uma terra viciada na palavrinha "eles" e trocá-la por outra que usa um bocadinho mais o termo "nós". Isso: que se responsabiliza pelos seus gestos, da condução da motoreta ao voto.

 

Estou entusiasmadíssimo. Tenho lido coisas extraordinárias sobre esse território para onde quero emigrar. É um lugar sem ressentimentos de maior, onde se distribuem facilmente elogios a quem os merece. Onde os homens e mulheres começam por cuidar do seu jardim para depois atenderem à floresta de todos. Onde os mais velhos não são abandonados nos seus quartos andares sem elevador. Onde os primeiros ministros assumem as suas culpas no cartório das dívidas e da má gestão. Onde há personalidades várias capazes de tirar algum do seu rendimento para financiar bolsas e outras iniciativas do género. Onde o ruído mediático em que se vive não é suficiente para apagar o sentido de discernimento de quem consome informação. Onde as pessoas não adiam - fazem. Onde há comprometimento - não a conversa do "deixa só passar esta fase".

 

Hoje de manhã foi a gota de água: vi um automobilista a dizer a um pedinte deficiente para ir dar uma volta.

 

Decidi: eu não quero mais viver aqui. Vou emigrar para o meu país.

publicado por Nuno Costa Santos às 16:07
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