Estranho quem vive barricado na sua selva. E se recusa a visitar, nem que seja por um segundinho, a selva alheia. Fico varado - eu que gosto de mixar universos e personagens e de circular em territórios contrastantes - com os cidadãos que só se sentem bem ou na tascarola ou no grémio literário. Aqueles que se recusam a passear diletantemente pelas diversas esquinas da vidinha, das mais limpas às mais abodegadas, e que preferem ficar estacionados, como se costuma dizer, em lugar seguro. Sempre o mesmo, sempre o mesmo, seja este elitista ou achungalhado.
Os que não passam a fronteira das freguesias do seu preconceitozinho para visitar outros lugarejos, ambientes e perfumes. Os que se recusam a falar com os Fanãs porque só se dirigem a pessoas de dois apelidos. Ou o contrário: gente que se recusa a falar com quem usa pulloveres em bico e tem uma maneira afectada de falar porque isso era ceder ao mundo "deles", do "guito" e da "tradição".
Peço desculpa, como o outro, por estar a sublinhar o óbvio : isto, seja o que isto for, vale a pena, parece-me (a mim e à dona Lurdes), pelas possibilidades. Por, num dia, podermos estar a beber um bela de uma imperialeca num tasco irrespirável e noutro estarmos a arriscar uma bem recomendada vinhaça numa esplanada com vista sobre a cidade. Por podermos ir à cinemateca e ao mercado do DVD de Campolide. Por podermos ter um amigo rasta, que nos convoca para épicas festarolas junto ao Martim Moniz, e outro que nos leva a passear pelos jardins aristocráticos da sua casa de familia, cheios de histórias e memórias.
Sim, percebo muito mal as pessoas que ou só gostam da pastelaria ou só gostam da casa de chá. Os que só frequentam a pastelaria e são incapazes de passar por uma casa de chá. Os que se recusam a descer da casa de chá "Tia Constança" para pedir uma bica ao balcão do café do Zé Nando. Sim, bem vistas as coisas, percebo mal o mundo quase todo.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.