Tenho tido sonhos estranhos, ultimamente. Há um, recorrente, em que dou por mim a correr pela colina relvada do ambiente do Windows. Corro sem destino. Não há vento, nem sol, somente ícones de programas que não sei abrir. A dada altura, apercebo-me dum ardor na canela direita, mas recuso-me a ver o que é. Corro ainda mais depressa, como se pudesse escapar à dor, mas ela não passa. Quando, finalmente, ganho coragem de olhar, vejo o Augusto Santos Silva a abocanhar-me o osso. É sempre assim. Depois, nunca me lembro do que acontece.
Noutro, sonho que acordo. Está um dia glorioso e salto da cama. Tomo banho e, quando enfrento o espelho para me barbear, paraliso ao dar-me conta de que sou o Vítor Constâncio. A minha mulher surge, então, no reflexo. Vem confortar-me como um abraço e esse momento traz alguma paz. Mas, quando a encaro para lhe falar daquela revelação terrível, apercebo-me de que casei com a Cândida Almeida.
E há muitos outros. Um em que vou mostrar os meus álbuns de fotografias às visitas e só lá estão fotos do José Maria Martins. O José Maria Martins em férias, o José Maria Martins na Eurodisney, o José Maria Martins na tropa, a primeira comunhão do José Maria Martins. Noutro, o Charles Smith incrimina-me. Noutro, estou a apresentar o livro de poemas do Gonçalo Amaral. Noutro, chego à caixa do supermercado para pagar e tudo o que tenho no cesto são porta-chaves com miniaturas do Mário Crespo. E muito mais.
Não farei qualquer esforço de psicanálise. Só quero dizer que tenho saudades do tempo em que todos os sonhos que recordava, de manhã, não envolviam mais que uma série de passes trocados com o Vítor Paneira, culminando num golo de cabeça meu, batendo um guarda-redes qualquer na final da antiga Taça dos Campeões. Acordava muito feliz.
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