Sexta-feira, 9 de Janeiro de 2009

Incógnito

Das coisas mais aborrecidas que o passar dos anos traz é começarmos a falar dos nossos sítios favoritos e repararmos que a muitos deles já não vamos há muito tempo.
Existe sempre a velha desculpa de que não se deve voltar a sítios onde se foi feliz mas, em minha opinião, é, quase sempre, uma desculpa para a forte preguiça que o passar dos anos provoca.
No caso de uma “boite” ou discoteca – ou como se queira chamar a um local onde se vai ouvir música, dançar e beber um copo – existem várias desculpas mais ou menos plausíveis: o ambiente mudou, a música piorou... Claro está, que há a possibilidade de nós sermos daquele tipo de pessoas que deixou de ouvir ou de gostar de qualquer tipo de música que não seja a que ouvia na adolescência ou de achar que ir a este tipo de sítios é para “gente mais nova”. Como não me incluo nestes dois grupos de gente – apesar de achar que jamais haverá uma banda como os Smiths – perguntei-me porque é que há tanto tempo não vou àquela que para mim foi – e segundo, visitas recentes de entendidos na matéria – e continua a ser uma das melhores, senão, a melhor discoteca de Lisboa: o Incógnito.
Tem aquilo que eu considero o espaço ideal para um lugar deste tipo: suficientemente pequeno para que não haja “grupinhos” e logo se meta conversa com gente que não se conhece e com espaço suficiente para poder “aprofundar” a conversa. Na época que lá ia amiúde ouvia-se a melhor musica de Lisboa e esse bom hábito continua a ser apanágio da casa.
Bom... houve uns episódios que me deprimiram um bocadinho e que me puseram a pensar se aquela história da idade para ir a sítios destes faria ou não sentido.
A primeira foi a de me começarem a “cravar” de uma maneira um bocadinho estranha: “O senhor pode-me dar um cigarro?” A segunda, ainda me deprimiu mais. Ao entrar na casa de banho, reparei nuns rapazes a fazer a “sopinha” para um charro. Com a minha entrada deitarem tudo fora... No meio deles estava um meu primo que foi presenteado com um calduço que o deixou muito confuso por ser acompanhado por uma severa reprimenda acerca do desperdício que ali tinha acontecido.
Também não deve ter ajudado as duas vezes em que não me portei, digamos... da melhor maneira. Apesar de me achar um cidadão respeitador, os rapazes do Incógnito eram – e ainda devem ser – tão simpáticos que em vez de me darem umas merecidas bofetadas puseram-me, gentilmente, na rua quando o Step On dos Happy Mondays, telepaticamente, me mandou iniciar um, confesso, pouco sexy strip tease ou quando fiz uma espécie de stage diving pelas escadas abaixo inspirado pelo Morrissey...

O Incógnito faz parte da minha vida: foi lá que tive a primeira zanga com aquela que é hoje a minha mulher, marcou – acho eu – os meus filhos, já que estou convencido que o gosto musical deles ficará para sempre ligado a essa casa, de tantas horas lá passadas na barriga da mãe. Um deles, aliás, teve quase a nascer em plena pista de dança entre o Park Life dos Blur e o Feel the Pain dos Dinossaur Jr.
Bem, vou-me deixar de mariquices e voltar a frequentar, mais assiduamente, o velho e bom Incógnito. Para que saibam, eu sou aquele velho careca que está a tentar passar por adolescente. Um aviso: se me chamarem senhor não levam cigarros.

 

Publicada na Revista Atlântico

publicado por Pedro Marques Lopes às 14:03
link | comentar
5 comentários:
De Brunhild a 9 de Janeiro de 2009
Visitei a capital em Novembro e tive de marcar ponto no Incógnito. Qual Lux, qual Frágil?!... O Incógnito é O sítio, concordo plenamente.
A mim não me cravaram tabaco. Simplesmente surripiaram-me descaradamente o cigarro que fumava descontraídamente na pista!

Estou triste pelo fim do Blogue Atlântico...
De Isa a 9 de Janeiro de 2009
mas que grand'a maluco que me saiu... sim senhora. e smiths, ai os smiths...
De wannabe a 9 de Janeiro de 2009
esse incógnito... esse incógnito.... ainda vai ser o motivo da minha próxima visita á capital! já o compararam com as festas das gigi no triplex, no porto. se assim for vale bem a viagem...
De Paulo Alves a 10 de Janeiro de 2009
A melancolia quando é fina e bem apanhada é tudo menos deprimente.
De voltaire-e-voltaren.blogspot.com/ a 11 de Janeiro de 2009
a primeira vez que me chamaram senhor foi para me pedirem um cigarro! ainda me lembro

Comentar post

Autores

Pesquisar

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Últimos posts

Frangos & galetos

...

Contra nós temos os dias

Do desprezo pela história...

É urgente grandolar o cor...

Metafísica do Metro

A Revolução da Esperança

Autores do Condomínio

Hipocondria dos afectos

A família ama Duvall

Arquivo

Dezembro 2020

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Junho 2008

Maio 2008

Abril 2008

Março 2008

tags

todas as tags

Subscrever

Em destaque no SAPO Blogs
pub