Ao contrário do que possam pensar, um grande golo não é apenas um hino ao futebol: é igualmente uma sinfonia ao movimento oscilatório periódico do eixo de rotação da redondinha, um motete à obliquidade da sempre enigmática órbita elíptica da bola, uma fugata elegíaca ao controlo da ionosfera do esférico.
No caso em apreço é de notar que o domínio teórico e prático das equações da rotação da linha das ápsides que Miguel Veloso demonstra ao provocar o deslocamento do esférico para o ápex, só é possível porque o novo corte de cabelo lhe garante o necessário equilíbrio biomecânico. De onde se conclui que este golo não é apenas um hino ao futebol: é igualmente uma demonstração dos poderes do Professor Karamba e da Isabel Queirós do Vale.
Depois deste golo espero - pelo menos - 4000 caracteres deste senhor a retractar-se deste post, conjungando - pelo menos - a ideia de "Espírito da Verdade" em Emmanuel Swedenborg e uma interpretação semântica da palavra "aporema" tudo isto devidamente sustentado em equações da distribuição electrónica de spin alto e spin baixo da camada ionizada da superfície da bola.
Acaso este post vos tenha entusiasmado a ponto de estarem a pensar deixar o vosso posto de designer gráfico de uma empresa de compostos agrícolas para estudarem física sub-atómica na Noruega, fiquem desde já a saber que não estão bem a ver a quantidade de coisas estranhas que um tipo encontra ao fazer pesquisas idiotas no Google enquanto afaga o pêlo da sua gatinha.
1. Dance me to the end of love
2. Bird on the wire
3. Everybody knows
4. No more A-roving
5. Joan of Arc
6. A thousand kisses deep
7. First we take Manhattan
8. There for you
9. The letters
10. Alexandra leaving
11. Chelsea Hotel (Leonard solo on guitar)
12. Suzanne (Leonard on guitar)
13. Tower of song (Leonard on keyboard)
14. Take this waltz
15. I'm your man
16. Sisters of mercy (Leonard on guitar)
17. Nightingale (Leonard on guitar)
18. Famous blue raincoat (Leonard on guitar)
19. Hallelujah
20. So long Marianne
(Alinhamento da digressão de Cohen. Os passos 4, 6, 8 e 10 não são obrigatórios. Quando memorizarem todas as letras, souberem todas as melodias, conhecerem todas as versões que Cohen fez de si mesmo, quando souberem quem é o herói country que surge em "Tower Of Song" e qual a duração original da versão que Nick Cave efectuou desta e quando me conseguirem explicar porque raio "Death Of a Ladies Man" não faz parte do concerto, se souberem tudo isto - tendo assim apenas um pouco abaixo de metade do meu conhecimento geral da Humanidade - então podem oferecer-me dois bilhetes para o concerto. Em troca ofereço a receita da sopa de cebola em que Cohen é especialista e a minha presença morena. Melhor é impossível.)
Há um momento na vida de todos em que deixamos de ser invisíveis aos olhos dos outros e começamos a ser alvo de todo o tipo de comentários.
Esse momento chama-se "parto".
Por esses dias somos uma janela de oportunidade para os adultos aparvalharem, somos um cluster de perguntas: "Ele não é lindo?", "Não achas que tem os olhos do pai?", ou, no meu caso, "Não te parece que quando crescer vai ser um bocado parvo?".
Depois é sempre a perder: as perguntas tornam-se adjectivos e, a dada altura, destes restam apenas os ruins.
Do agrupamento de adjectivos recorrentemente empregues pelos amigos dos amigos dos amigos dos meus dois amigos para me descrever, constam preciosidades inusitadas como "arrogante", "preconceituoso", "snob", "viperino" e "lindíssimo". Não é verdade: sou apenas razoavelmente bonito.
Por vezes fico, não digo aterrado, não digo perplexo, não digo espantado, mas admito que assarapantado com algumas coisas que leio - e vou explicar porquê. Antes de Janeiro de 2017 prometo explicar porquê.
Chamaram-me a atenção para um comentário neste post em que se diz que estoutro queriduxo post, suavemente mal interpretado por uma (imagino) frágil Dulcineia, está a "transbordar de preconceitos e arrogância". Também se diz que eu finjo não ser um palerma qualquer, o que não é verdade: eu finjo ser todo o tipo de palerma imaginável. É possível que a minha imaginação seja escassa - mas a minha palermice não.
E é verdade, um tipo transborda: às vezes com um pré-conceito (nem sempre bem aceite), por vezes com alguma arrogância, mas também com carinho, doçura e um cigarro no fim.
O que no mencionado comentário me intrigou foi o final, em que a menina diz que textos daqueles "fazem-me lembrar os artigos do João Pereira Coutinho no Expresso (ainda para mais com a boca sexista no final...)".
Ora isto não é verdade porque:
1: Não há qualquer semelhança entre a minha boca e a do João Pereira Coutinho.
2: Digo isto sem saber como é a boca do João Pereira Coutinho, já que naquela fotografia no Expresso ele tem a dita tapada por um instrospectivo dedo indicador genuflectido, a "transbordar de preconceito e arrogância".
É verdade que o post não era brilhante, talvez apenas mau (ou medianamente péssimo), mas falta aqui um certo orgulho insultador: quando se insulta há que insultar com pertinácia, com arrojo, com - inclusive - algum quebranto existencial.
O insulto é uma forma estética de catarse, faz bem, alivia. Uma boa parte do rock'n'roll insulta. NIck Cave insulta mulheres, Cohen insulta-se a si mesmo, Dylan insulta as ex-mulheres e Lou Reed insulta toda a gente. Sou solidário com quem insulta. Um bom insulto, em mim, provoca quase uma fusão com o insultador: em sendo bem esgalhado, eu deixo-me levar pelo insulto e dou por mim numa espécie de furor.
Por exemplo: nos meus sonhos mais libidinosos sou insultado com contumácia pela Giselle Bünchen que, numa ânsia libertadora, com uma tocha numa mão e um livro na outra, me diz: "Transbordas de arrogância, seu palerma".
E eu, juro, não levo a mal. Até porque aquele trema no "u" dá a tudo o que saia daquela boca uma irresistível elegância.
O site Edge (www.edge.org) foi criado para reunir aquilo que o seu autor resolveu chamar de «terceira cultura»: cientistas, investigadores, escritores, filósofos e intelectuais sortidos juntam-se virtualmente para dar a sua visão do mundo. É um lugar extraordinário para ginasticar a mente.
Mas o sítio tornou-se conhecido sobretudo por uma pergunta anual que colocava a essa comunidade. A pergunta de 2005 foi a mais brilhante. A todas estas estrelas da galáxia cientifica e literária perguntou-se: «O que é que acredita ser verdade, mesmo sem poder prová-lo?». A pergunta foi saudada pela imprensa com mimos como o do The Times, que a considerou «a cocaína do mundo pensante», o que a meu ver reflecte um pouco dos interesses do jornalista que cunhou o epíteto, mas quem sou eu para julgar alguém? Adiante. . O que me fascinou foram as respostas (reunidas agora em livro de edição portuguesa: Grandes Ideias Impossíveis de Provar, ed. tinta da China).
Gosto da que deu o professor de Psiquiatria e Psicologia Randolph Nesse, que diz acreditar (lá está, sem poder provar) que «as pessoas ganham uma vantagem selectiva por acreditarem em coisas que não podem provar». Isto são boas notícias para os crentes de todo o mundo em geral e aqueles que acham que o Benfica é uma boa equipa em particular. De resto, há muitas respostas comuns e, vindas de cientistas, previsiveis: acreditam que há vida inteligente algures no universo, que Deus não existe, que não há vida depois da morte física, que o amor verdadeiro existe, que a ciência... Desculpem, permitam voltar atrás: que o amor verdadeiro existe? Aí está algo que posso debater.
Quem o disse foi o professor de Psicologia David Buss, depois de ter passado décadas da sua vida a estudar «perseguidores obcecados, predadores sexuais e assassinos de conjuges». Uau, falem-me de optimistas. Mas a verdade é que nem este prolongado convívio com a natureza humana o desanimou.
A mim ninguem me perguntou, mas é para isto que servem os blogues. Assim, e retirando a ontologia ao que é um amor «verdadeiro», posso anunciar a um mundo ansioso: acredito no amor, e verdadeiro. Mas pelos meus sintomas, tenho medo.
É uma ditadura benigna, um oxímoro que acalentamos com todo o nosso coração. Um regime de força que impomos alegremente à nossa alma. A paixão é a revolução, romântica e generosa; o amor são os revolucionários a chegarem ao poder. Não nos basta querermos o Outro: queremos ser o Outro e queremos que o Outro se transforme em nós. É um totalitarismo implacável, que nos faz chorar à miníma ausência ou escrever «Tanto do meu estado me acho incerto». É uma injustiça,uma dádiva, uma violência, uma imposição, uma prisão que nem sequer é preventiva. É enfim, o melhor do mundo. Acredito que exista, mas o que é mais triste é que gostaria de o poder provar.
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