Aqui no bairro a especialidade - sabemos disso - é protelar. E todas as alturas de ano ajudam a essa causa de deixar para daqui a sete meses o que podia ser feito hoje. Pensei nisso agora que passámos as épocas do Natal e da passagem de ano. Queria combinar alguma coisa com alguém e népias. Nada feito. Porquê? Por causa desta mensagem automática: "Sabes que isto nesta altura do ano é uma confusão, é uma série de jantares". Sei, sei que é assim. Mas também sei, não sem alguma rezinga, que entre os repastos familiares há intervalinhos - e não são tão exíguos quanto isso -em que o cidadão pode dar-se ao luxo de oferecer dois minutos de atenção a quem o procura. Digo eu.
Mas o problema é que, como sabe o sinusítico leitor, o período a seguir também serve para o campeonato das desculpas. Lanço, já em Janeiro: "Então, quando é que nos encontramos?". A resposta sai, quase tão automática quanto a anterior: "Sabes que isto do início do ano é um bocado complicado". Porquê, pergunta-se. "Há uma grande ressaca das festas de Natal e de ano novo". Pois. À sugestão: "Pode ficar para o próximo mês?" respondo com um "ok" medianamente esperançoso. Chega-se a Fevereiro e brotam novíssimas desculpas. "Mas eu não sabia que gostavas do Carnaval?", arrisco. A resposta: "Não, não gosto. Mas aproveito e vou com a Eliana dar um giro à terra dos pais dela". E, pimba, lá se vai, perdida entre confetes e melancólicas buzinas, mais uma oportunidade.
Depois, pronto, depois é a Páscoa. "Sabes que isto". Sei, também tenho família. E depois chega, qual onda pré-veraneante, o generoso período "antes das férias", em que o importante é "despachar uma série de coisinhas que ficaram pendentes durante o resto do ano". E o Verão, meus queridos, é para ir a banhos, não para os compromissos da amizade. Na mui chique rentrée, há a desculpa da rentrée. Onde há sempre muita tarefa para executar, muita época nova para preparar, muito entusiasmo para consumir. E a reentrée, aqui no bairro, vai de Setembro a Dezembro, que é como quem diz chega ao Natal dos Hospitais com uma pinta que só visto.
E prontos. Até à próxima. Vida.
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