Coloquemos a situação desta forma terrena: há cada vez mais gente a aproveitar a onda da crise para fazer cortes. Empresas de generoso orçamento ficaram subitamente aflitas porque dá jeito que assim seja. Ah e tal, a crise obriga-nos a fazer cortes. Dá vontade de perguntar: e esses cortes não compreendem o despedimento imediato e compulsivo de Vossa Excelência? Mas um tipo cala-se que é por causa das tosses.
Não era disso que vinha falar aqui ao Sinusite. Vinha para deixar um lembrete: "É preciso fazer". Para mim próprio, claro - porque moralista só o sou com os amigos. É preciso fazer, sim. Que é como quem diz: é preciso não sucumbir ao discurso da crise. É preciso - diz que sim - deixar de olhar tanto para cima, para "os poderes". E agir. Criar coisas. Projectos, ideias, lojas, negócios (existem os que só nestes instantes encontram a sua oportunidade), comunidades, delírios.
Acredito - por mais cliché que o discurso possa parecer - que as alturas de crise são das melhores para fazer. Para arregaçar as mangas e fazer. Nas áreas em que cada um se dá melhor: sejam elas a carpintaria, o sapateado ou a poesia. Dizem que não há guito, que há muita nuvem no céu, que isto ainda vai ser pior mas, como dizia o outro (que é quem como quem diz o Fernando Assis Pacheco), "um homem tem que viver/ E tu vê lá não te fiques". Tem toda a razão o Assis nesse "Cuidar dos Vivos", livro de 1963 e hoje cada vez mais premente. Não, não te fiques. Um homem, escreveu ele, tem que viver com um pé na Primavera. Por isso dá-lhe. Com o melhor de ti. Só assim podes "um dia com uma saudade burra/ dizer adeus a tudo isto".
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