Há uma canção dos James que diz que é necessário saber a verdade para acreditar. Disparate.
Nunca conheci crença que precise de qualquer tipo de verdade. “Felizes os que acreditam sem terem visto”, dizia Jesus Cristo. As crenças só são realmente fortes se desprezarem a verdade. Ou melhor, a verdade e a crença são as faces da mesma moeda. Nem há verdade sem crença, nem crença sem verdade. Se pensássemos serem realidades intrinsecamente diferentes estávamos a dar um carácter divino ao julgamento humano. Como se cada um de nós fosse capaz de conhecer a verdade ou o seu significado.
A verdade não é mais que uma opinião sobre as coisas. E nós dependemos dessas opiniões como do sol, do ar, da água, da comida. São elas – e são infinitamente mais do que imaginamos – que nos permitem ir sobrevivendo sem enlouquecer ou sem colocar em causa tudo o que aparentemente é fundamental para a nossa existência. Vivemos tão mais sossegados quanto mais firmes forem as nossas opiniões. Precisamos que sejam sólidas, à prova de contestação. Chegamos ao limite de não as testar, de não as discutir, de não nos aproximarmos de quem as possa pôr em causa. O risco é demasiado grande. Uma gota de dúvida transforma-se rapidamente num imenso rio de incerteza capaz de derrubar o dique que julgávamos impenetrável.
Ai dos que duvidam, dos que ousam olhar para o outro lado, dos que teimam em procurar, dos desassossegados. Esses apenas encontrarão mais perguntas, mais entroncamentos, mais e mais portas, mais e mais angústia, mais e mais inquietação. São esses, porém, que amo. Os que o Gide pensava serem os únicos em quem confiar: “Believe those who are seeking the truth. Doubt those who find it”.
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