Sexta-feira, 30 de Setembro de 2011

Sérgio

Costuma desvalorizar o apelido que tem, possivelmente por ser demasiado fácil, por resultar num efeito de lapela para uma personalidade discreta por vocação e feitio. Mas é a paixão que melhor o define. Um entusiasmo e uma entrega doces, atentos, persistentes. Sim, Sérgio Paixão tem uma virtude pouco distribuída: é capaz de fazer durar o sentimento apaixonado, que os manuais, as revistas do coração (e a vidinha também) dizem fugaz. 

 

A sua história já leva muito que contar até ao momento em que se fixou na Horta e passou a assumir a missão de traduzir Brel para português e divulgar tudo o que se vai passando com o artista em toda a parte. Até o instante em que conciliou a sua vida profissional com a vontade de fazer coisas como um grupo de cantares Maré Viva ou o grupo de teatro chamado Carrosel. Até tantas outras aventuras.

 

Nascido em 1948, na cidade de Lisboa dos anos pós-guerra, este filho de operários viveu os anos 50 em Belém, junto àquele rio para onde o levava o pai nos dias de pescaria – recorda-se das brincadeiras atrás da Central Eléctrica (hoje Museu da Electricidade). “As pescarias não eram grandes mas aquele rio a passar e a margem do outro lado nunca mais me deixaram”, diz. Outras eram as visitas no Verão à praia da Trafaria ou à praia de Algés. Passados os anos de escola primária, a trezentos metros de casa, Sérgio foi em 1959/60 para a modelar escola Francisco Arruda, no Alto Santo Amaro, dirigida pelo professor Calvet Magalhães, que punha a criançada sentada no chão a ver cinema aos sábados de manhã. “Para nós, miúdos da classe operária, era um luxo”. As tardes, passava-as nas obrigações da Mocidade portuguesa, com farda a preceito (e a contragosto) e preparação militar. Apanhava sempre o eléctrico que a Carris punha ao serviço dos operários com preços mais baratos – o “carro operário”. 

 

Passou os anos 60 como qualquer adolescente da época, tendo como hábito ir ao cinema Promotora, no Largo do Calvário, assistir aos filmes de Cliff and the Shadows e tocar viola para fazer as suas covers de alguns hits da época. No final dessa década teve início a sua história com Jacques Brel: “Comecei a ouvir um tipo (pensava ser francês) que me tocou de uma maneira diferente. Pela maneira como cantava e pelo que cantava. Nunca mais lhe perdi o rasto”. Nunca mais lhe perdeu o rasto, sim, durante um percurso em que, entre outras coisas, foi pintor de rua, andou pela Holanda e, instante decisivo, conheceu uma mulher faialense que o levou aos Açores. Brel, esse, transportou-o na bagagem, e surpreendido ficou por saber que o artista havia passado pela ilha que agora habitava. “A partir daí (princípio dos 80) comecei a investigar tudo sobre ele, a comprar discos e livros e a traduzir as canções”. Depois é o que sabem os mais atentos. Fez um programa para a rádio e a televisão sobre o grand Jacques. Traduziu no seu blogue, Canto do Brel, as suas letras para português e todos os dias tem uma novidade para postar sobre o artista – uma notícia, um espectáculo, um filme, um recital.

 

Sérgio fala de Jacques Brel melhor do que ninguém. Por isso o melhor é calarmo-nos para escutar as suas palavras: “As primeira músicas que me ‘agarraram’ foram ‘Les Bourgeois’, ‘Au Suivant’, ‘Les bonbons’. e o enorme ‘JEF’! Mas não é fácil dizer qual é a preferida. Porque há canções que me comovem como ‘Ne Me Quittes Pas’ ou ‘Ces gens lá’, canções me fazem chorar como ‘Les Vieux’ ou ‘Mon Père Disait’, canções que me divertem sempre como ‘Le Caporal Casse Pompon’, ‘Les Bigottes’ ou ‘Les Timides’. Mas todas elas me deixam uma emoção incontida atravessada na garganta, uma vontade estranha de pôr mais alguém a ouvir ‘aquilo’ que é bom demais para se perder”. Pausa. Para o remate: “Brel é tão diferente dos outros cantores que conheço: é um ser único (como artista) porque sem ele, as letras e as melodias seriam boas na mesma. Mas só ele consegue juntar as duas coisas. E fá-lo com a voz, com o coração, com os olhos, com os braços, com as mãos, com o corpo todo. Por aí é que tenho feito a ‘minha campanha’ para divulgar o seu nome. Na rádio, na televisão e agora na net”. Nós só temos que agradecer.

publicado por Nuno Costa Santos às 17:34
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De Roberto a 3 de Outubro de 2011
Sérgio, um Homem que a cultura açoreana e em especial a faialense não sabe aproveitar... Apenas partilhei as suas qualidades durante dois anos, mas sao dois anos que nao mais esqueço...
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